AI: função de jornalista ou RP?

Na história da evolução da assessoria de imprensa, existem dois fatores que diferenciam o caso brasileiro do restante do mundo. O primeiro é temporal; a importância da AI foi sentida no Brasil, na iniciativa privada, quando já estava consolidada nos EUA e na Europa. A segunda grande diferença é que, no país, a relação com a imprensa é feita, geralmente, por jornalistas, e não por relações públicas, como ocorre em outros locais.

De acordo com Moutinho e Souza (2003), na União Européia, a AI é considerada incompatível com a atividade de jornalista. Os autores trazem como exemplo o que ocorre em Portugal. Neste país, o jornalista que deseja atuar como assessor deve ter seu registro profissional de jornalista suspenso.

Como cita Duarte (2008), tanto o trabalho de relacionamento com a mídia, quanto o de edição de publicações jornalísticas empresariais, são originariamente exercidos por relações públicas. No Brasil, porém, as atividades passaram a ser executadas essencialmente por jornalistas a partir da restrição no mercado e pelo crescente interesse das instituições em profissionais que tivessem acesso facilitado nas redações.

O debate sobre qual seria o profissional mais capacitado a assumir as assessorias de imprensa (jornalistas ou relações públicas) é, ainda hoje, pauta de discussões. O assunto gera controvérsias entre os teóricos da área e ainda não se chegou a um consenso.

Duarte (2008) pontua que, a ocupação do mercado de assessorias e publicações empresariais, por jornalistas, começa a ser ampliado nos anos 80, quando o relações públicas vê diminuídas suas possibilidades de atuar na área. Entre os motivos apontados pelo autor estão o preconceito com que os RPs eram vistos nas redações (o RP teria dificuldade em entender os interesses da imprensa). E o fato de os jornalistas encontrarem na AI um novo mercado, que proporcionava melhores condições de trabalho e mais alta remuneração.

É fato que a área de relações públicas é abrangente e diz respeito à “informação de caráter institucional entre a entidade e o público através dos meios de comunicação.” (DUARTE, 2003, p.92). Porém, ainda na década de 80, a Associação Brasileira de Imprensa, e sindicatos de jornalistas, firmaram que a relação com a imprensa e a edição de produtos noticiosos, mesmo que institucionais, são cargos exclusivos de jornalista.

No ano de 1984 o então presidente da Fenaj, Audálio Dantas, anunciou, durante o I Encontro Nacional dos Jornalistas em Assessoria de Imprensa, o acordo que tinha estabelecido com a presidente do Conselho Nacional de Relações Públicas (Conrep), Vera Giagrande. “Pelo acordo, a área de RP aceitava ceder aos jornalistas a reserva de mercado da assessoria de imprensa.” (CHAPARRO, 2003, p.46).

A partir de então, a Fenaj tomou para si o papel de regular e orientar a AI. Em 1986 a Federação lançou o Manual de Assessoria de Imprensa (atualizado em 1994 e 2007). Duarte acredita que o manual “tornou-se referência histórica ao legitimar e balizar a prática do jornalismo especializado em assessoramento de imprensa, até orientando que a produção de publicações seria um de seus produtos.” (2003, p.92).

O autor pondera que a ocupação de jornalistas no cargo de AI, mais do que aceita, foi estimulada na imprensa “no momento em que se faziam críticas à competência dos relações públicas para exercer a função.” (Idem). Já que os jornalistas tinham maior facilidade em compreender os mecanismos de funcionamento e os interesses dos veículos de comunicação, conquistaram o mercado de AI.

Segundo o Manual de Assessoria de Imprensa, a AI é função de jornalista profissional. A afirmação é justificada pela Fenaj através da Regulamentação da Profissão de Jornalistas, (Decreto n.º 83284 de 13 de março de 1979), na qual são sublinhados os seguintes tópicos (2007, p.12):

Art. 1o. - É livre, em todo território nacional, o exercício da profissão de
Jornalista, aos que satisfizerem as condições estabelecidas neste
Decreto.
Art. 2o. - A profissão de Jornalista compreende, privativamente, o
exercício habitual e remunerado de qualquer das seguintes atividades:
I -
redação, condensação, titulação, interpretação, correção ou coordenação de
matéria a ser divulgada, contenha ou não comentário;
II - comentário ou
crônica, por meio de quaisquer veículos de comunicação;
III - entrevista,
inquérito ou reportagem, escrita ou falada;
IV - planejamento, organização,
direção e eventual execução de serviços técnicos de Jornalismo, como os de
arquivo, ilustração ou distribuição gráfica de matéria a ser divulgada;
(*)
Entenda-se também release
V - planejamento, organização e administração
técnica dos serviços de que trata o item I;
VI - ensino de técnica de
jornalismo;
VII - coleta de notícias ou informações e seu preparo para
divulgação;
VIII - revisão de originais de matérias jornalísticas, com vista
à correção redacional e à adequada da linguagem;
IX - organização e
conservação de arquivo jornalístico e pesquisa dos respectivos dados para
elaboração de notícias;
X - execução de distribuição gráfica de texto,
fotografia ou ilustração de caráter jornalístico, para fins de
divulgação;
(*) Entenda-se literalmente release.

Na década de 60, quando a legislação da profissão de jornalista e relações públicas foi definida, a assessoria de imprensa não foi abordada pois, na época não era considerada importante. Mesmo assim, para a Fenaj, não há dúvidas que a rotina do assessor de imprensa compete exclusivamente aos profissionais com formação em jornalismo.

Autores renomados, como Margarida Kunsch e Roberto de Castro Neves, defendem que o exercício compete ao relações públicas. Enquanto que importantes autores, que pesquisam a área específica de assessoria de imprensa, com Rivaldo Chinem, Boanerges Lopes, Elisa Kopplin, Luiz Artur Ferrareto e Maria Tereza Garcia advogam que é função de jornalista. Como se vê, as posições estão longes de serem unânimes.

Na compreensão de Duarte (2003), os repórteres e editores dos veículos de comunicação prezam pelo contato com os profissionais que saibam atender com competência as suas necessidades, não importando qual é sua formação. Porém destaca que, o contato com os jornalistas exige especialização, e nesse ponto os graduados em jornalismo levam vantagem.

O fato é que, por mais estranho que possa parecer em outros países, no Brasil é assumidamente aceito que jornalistas atuem como assessores. Inclusive é permitido que o profissional tenha dupla jornada de trabalho, servindo como jornalista em um turno e como assessor em outro. A tendência é que os jornalistas ocupem ainda mais esse cargo, já que a maioria das universidades abrange em seus currículos de jornalismo a disciplinas de AI.

O mercado parece mesmo estar a favor dos jornalistas, não diminuindo a importância dos RPs, que em alguns casos, dependendo de sua postura, podem até mesmo atuar com melhor desenvoltura na atividade de AI. Deixando de lado a preocupação com qual a melhor formação acadêmica, Duarte (2003) evidencia que “a atividade dos assessores de imprensa tem seu controle feito nas redações como um filtro e nelas é que a credibilidade e competência do profissional são testadas.” (Disponível na internet. URL: http://ww.comunicacaoempresarial.com.br. Acesso em 16 de abril de 2008).

Em 2006, o Portal Imprensa, divulgou pesquisa, feita juntamente com a Aberje e o website MaxPress, cujo resultado foi de que a assessoria de imprensa é trabalho para jornalista. Foram ouvidos 405 jornalistas de todo país, de um total de 16.713, selecionados a partir do mailing MaxPress, um dos mais completos cadastros de jornalista em atuação do Brasil.

A pesquisa mostrou que, para 77% dos entrevistados, o responsável pela assessoria de imprensa deve ser um jornalista. Apenas 13% acham que essa função deve ser exercida pelo relações públicas. Para 6% dos entrevistados, tanto faz. 2% preferem publicitários cuidando da assessoria de imprensa e outros 2% afirmam que não deve haver intermediário nesse tipo de serviço.

É fundamental observar que, por enquanto, ainda não existe uma legalização específica estabelecendo qual deve ser a formação acadêmica do assessor de imprensa. Por isso, a postura mais construtiva que o profissional de comunicação pode adotar é deixar de lado os preconceitos e esmerar-se na busca pela qualificação constante da categoria.
............................................................................
REFERÊNCIAS


DUARTE, Jorge (Org). Assessoria de imprensa e relacionamento com a mídia: teoria e técnica. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2003. 411 p.

______. Assessoria de Imprensa, o caso brasileiro. Disponível na internet. URL: http:// http://www.comunicacaoempresarial.com.br/. Acesso em 16 de abril de 2008.

CHAPARRO, Manuel Carlos. Cem anos de assessoria de imprensa. In: DUARTE, Jorge. Assessoria de imprensa e relacionamento com a mídia: teoria e técnica. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2003. 411 p.

Manual Nacional de Assessoria de Imprensa – Federação Nacional dos Jornalistas – FENAJ. Rio de Janeiro, 2007. Disponível na internet. URL: http:// http://www.fenaj.org.br/. Acesso em 02 de abril de 2008.

MOUTINHO, Ana Viale; SOUZA, Jorge Pedro. Assessoria de Imprensa na Europa. In: DUARTE, Jorge. Assessoria de imprensa e relacionamento com a mídia: teoria e técnica. 2.ed. São Paulo: Atlas, 2003. 411 p.