A internet: o mundo interligado


Pensando no nível de desenvolvimento que as tecnologias da informação e comunicação alcançaram, sem dúvida pode-se afirmar que o ápice das transformações tecnológicas ocorridas foi o advento do computador. Para Lima “o computador tirou o ser humano da janela que foi colocado pela televisão, onde ele via os fatos acontecerem mas não podia intervir para um processo de participação e construção diária, em função de seus objetivos.” (2000, p.27). O autor diz que

Enquanto o automóvel representou uma extensão tecnológica das pernas do ser humano, o rádio e o telefone, uma extensão de seus ouvidos e a televisão, uma extensão de sua visão, o computador foi mais longe. Muito mais longe, pois planetarizou o cérebro humano, dando chance para que seu pensamento viaje pelo planeta, conecte-se com outros pensamentos, desenhe planos e estratégias de ação e construa o instrumental de que precisa para continuar sua trajetória de mudança no meio. (Idem).

Segundo Lima, a grande maioria das novas tecnologias inventada pelo homem é resultante de uma tecnologia básica que é o computador. Na visão do autor, o computador é o eixo-central das mudanças paradigmáticas que o mundo vivencia.

Na verdade, estamos assistindo à criação de tecnologias derivativas do computador, o qual está aumentando em progressão geométrica sua capacidade de expansão, nos levando a rever nossa concepção de meio ambiente e modificando substancialmente nosso relacionamento com nosso próprio processo evolutivo. (2000, p.10).

Essa capacidade do computador deve-se principalmente ao fato de ser o suporte básico para a internet. Com relação ao procedimento de transformações históricas, Lyon diz que “o processo se acelerou durante o século vinte à medida que primeiro o telégrafo, depois os telefones, o rádio, a TV e agora os computadores e as telecomunicações aparecem em rápida sucessão, facilitando tudo.” (2005, p.75).
Lima destaca que o computador tem papel fundamental no processo de análise dos fatores intervenientes da mudança “por sua capacidade de atuar como aglutinador de outros meios e de sua capacidade sinérgica de se fazer presente na grande maioria das novas invenções da segunda metade deste século.” (2000, p.16).
Conforme o autor, ao levar esta nova tecnologia para a sua residência, o homem “iniciou um processo irreversível de planetarização, tendo a sua disposição recursos cada vez mais sofisticados que vão se tornando gradualmente mais simples em termos de operacionalização.” (Idem, p.27).
Para Castells, a internet é a espinha dorsal da comunicação global, mediada por computadores, “é a rede que liga a maior parte das redes.” (1999, p.431). Na visão do autor, a internet é fundamental para se entender o atual momento histórico, pois “a Internet, em suas diversas encarnações e manifestações evolutivas, já é o meio de comunicação interativo universal, via computador, da Era da Informação.” (Idem, p.433).
Segundo ele, “a Internet tem tido um índice de penetração mais veloz do que qualquer outro meio de comunicação na história.” (Idem, p. 439). Com relação ao crescimento da Internet Takahashi cita que somente nos EUA a Internet atingiu 50 milhões de usuários em apenas quatro anos. Para atingir esse mesmo número de usuários o computador levou 16 anos, a televisão 13 e o rádio 38. (2002, p.20-21).
Devido a sua importância, a integração de vários modos de comunicação em rede interativa é, de acordo com Castells, uma transformação tecnológica de dimensões históricas, similares ao advento do alfabeto. Em suas palavras, “o surgimento de um novo sistema eletrônico de comunicação, caracterizado pelo alcance global, integração de todos os meios de comunicação e interatividade potencial, está mudando e mudará para sempre nossa cultura.” (1999, p.414).
A internet representa, para o autor, “a formação de um hipertexto e uma metalinguagem que, pela primeira vez na história, integra no mesmo sistema, as modalidades escrita, oral e audiovisual da comunicação humana.” Este acontecimento é da mais alta relevância, visto que “muda de forma fundamental o caráter da comunicação [...] E a comunicação, decididamente, molda a cultura”. (Idem). Ainda falando sobre a relação entre comunicação e cultura, Castells afirma que

Como a cultura é medida e determinada pela comunicação, as próprias culturas, isto é, nossos sistemas de crenças e códigos historicamente produzidos são transformados de maneira fundamental pelo novo sistema tecnológico e o serão ainda mais com o passar do tempo. (Idem).

Lima acredita que a mais importante contribuição da tecnologia computacional é a possibilidade de conectividade. Ele diz que, através da internet, existe “a possibilidade de nos comunicarmos de forma multidirecional com quaisquer partes do planeta, trocando dados e acessando informações de forma interativa, criando, de forma concreta, a aldeia global.” (2000, p.29). Ao abordar a questão da conectividade, Lyon ressalta que “onde antes havia muitos pequenos ‘mundos’, hoje existe apenas um.” (2005, p.75).
A internet é uma rede de redes. A rede mais conhecida e utilizada é a WWW (World Wide Web). Através dela, textos, imagens, sons, vídeos, animações e os mais variados recursos multimídia se combinam, formando hipertextos que interligam milhares de documentos através de links. A WWW propiciou uma verdadeira revolução na comunicação global. De acordo com Castells

A coexistência pacífica de vários interesses e culturas na Rede tomou a forma da World Wide Web – WWW (Rede de Alcance Mundial), uma rede flexível formadas por redes dentro da Internet onde instituições, empresas, associações e pessoas físicas criam os próprios sítios (sites), que servem de base para que todos os indivíduos com acesso possam produzir sua homepage, feita de colagens variadas de textos e imagens. (1999, p.439-440).

Falando sobre a importância da internet, Lima diz que a WWW representa “um marco e um divisor de águas no processo de mudança paradigmática, ficando evidente que o acesso e o manuseio da informação em termos globais se organizam em fases caracterizadas por antes e depois da existência da WEB.” (2000, p.29).
Para Lima, navegar na WEB é o primeiro grande passo de nossa sociedade rumo à consolidação do novo paradigma. Nas palavras do autor

Isto ocorre porque a WEB muda por completo nossa relação com a informação ou conhecimento. Não só no que tange ao envio e recepção da mesma, como também modifica o conceito enraizado em nossa sociedade de que informação representa uma forma de controle e poder. (2000, p.31).

Através da internet, as redes se ligam entre si formando uma teia. Embora não fisicamente, as novas mídias aproximam as pessoas de maneira rápida, fazendo com que as fronteiras geográficas não tenham mais tanta importância. Essa idéia não é recente. Há mais de 40 anos, o comunicólogo e filósofo canadense Marshall McLuhan já havia proclamado essa mudança paradigmática na forma de o ser humano se relacionar com a tecnologia. Tendo como base os avanços tecnológicos, ele considerava que a humanidade caminhava rumo a uma “aldeia global”, onde seria possível transportar o mundo para a própria residência e onde o globo se transformaria numa pequena aldeia, na qual todos se relacionam com todos de maneira democrática. Suas idéias ficam evidentes ao analisar o impacto da internet e suas conseqüências no meio. Assim, a internet, e não a televisão como ele inicialmente imaginava, é a responsável pela conectividade do mundo e por transformar o planeta em uma “aldeia”.
Castells acredita que a visão de McLuhan não é suficientemente abrangente para denominar e caracterizar o atual contexto comunicacional.

Embora a audiência recebesse matéria-prima cada vez mais diversa para cada pessoa construir sua imagem do universo, a Galáxia de McLuhan era um mundo de comunicação de mão única, não de interação. Era, e ainda é, a extensão da produção em massa, da lógica industrial para o reino dos sinais e, apesar do gênio de McLuhan, não expressa a cultura da era da informação. (1999, p. 427).

Abordando as redes de comunicação mediada por computadores, Castells afirma que “diferentemente da mídia de massa da Galáxia de McLuhan, elas têm propriedades de interatividade e individualização tecnológica e culturalmente embutidas.” (Idem, p.442).
A tecnologia está em constante aprimoramento. De acordo com Castells “as pessoas moldam a tecnologia para adaptá-la as suas necessidades.” (Idem, p.449). Dessa forma, cada grupo social usa a tecnologia de acordo com suas intenções. Para o autor, a forma de comunicação eletrônica multipessoal, que é representada pelos modos de comunicação mediada por computadores, “tem sido usado de formas diferentes e para diferentes finalidades, tantas quantas existem no âmbito da variação social e contextual entre seus usuários” (Idem). Ele ressalta ainda que “o denominador comum da CMC é que [...] ela não substitui outros meios de comunicação, nem cria novas redes: reforça os padrões sociais preexistentes.” (Idem).
A partir da fusão da mídia de massa personalizada e globalizada com a comunicação mediada por computadores, surgiu, na segunda metade da década de 1990, um novo sistema de comunicação eletrônica. Conforme Castells, “o novo sistema é caracterizado pela integração de diferentes veículos de comunicação e seu potencial interativo. Multimídia, como o novo sistema logo foi chamado, estende o âmbito da comunicação eletrônica para todo o domínio da vida.” (Idem, p.450). Para o autor, a peculiaridade da nova mídia é que “os novos meios de comunicação eletrônica não divergem das culturas tradicionais: absorvem-nas.” (Idem, p.456).
De acordo com Castells a multimídia apresenta as seguintes características: 1) grande diferença social e cultural dos usuários, o que leva à segmentação dos públicos; 2) a multimídia fica restrita às pessoas com tempo e dinheiro e as diferenças sociais e culturais são fundamentais no uso do novo meio; 3) todos os tipos de mensagens, difundidos no mesmo meio, induzem a um padrão cognitivo comum, 4) é capaz de apreender, em toda sua diversidade, a maioria das expressões culturais, pois todas as manifestações vêm juntas no mesmo ambiente digital.
Esse último item é considerado pelo autor como um dos mais importantes. Em suas palavras, o advento da comunicação multimídia “é equivalente ao fim da separação e até da distinção entre mídia audiovisual e mídia impressa, cultura popular e cultura erudita, entretenimento e informação, educação e persuasão.” (Idem, p.458). Ele diz ainda que

O que caracteriza o novo sistema de comunicação, baseada na integração em rede digitalizada de múltiplos modos de comunicação, é sua capacidade de inclusão e abrangência de todas as expressões culturais. Em razão de sua existência, todas as espécies de mensagens do novo tipo de sociedade funcionam em um modo binário: presença/ausência no sistema multimídia de comunicação. Só a presença nesse sistema integrado permite a comunicabilidade e a socialização da mensagem. (1999, p. 460-461).

Ao referir-se ao mundo interligado pela internet, Pierre Lévy fala em ciberespaço, definindo-o como o “espaço de comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias dos computadores.” (2000, p.92, grifo do autor). Dessa maneira, o computador deixa de ser um centro para tornar-se um nó conectado com a rede. Como afirma o filósofo, este é “o terreno onde está funcionando a humanidade hoje.” (2000, p.13).
Lévy afirma que o ciberespaço se difere da mídia tradicional “porque é nesse espaço que todas as mensagens se tornam interativas, ganham uma plasticidade e têm uma possibilidade de metamorfose imediata.” (Idem). Características suficientes para transformar as culturas humanas em uma cibercultura. Definição que refere-se à cultura digital e que designa a formação de uma única comunidade mundial, mesmo sendo essa comunidade formada por indivíduos desiguais e conflitantes.
As bases das revoluções vividas anteriormente pelas sociedades voltadas à indústria foram a energia e a matéria. Já o atual período histórico exige que o ser humano mude sua compreensão de tempo e espaço, sendo esses “as principais dimensões materiais da vida humana.” (CASTELLS, 1999, p.467). Dessa maneira, “tanto o espaço quanto o tempo estão sendo transformados sob o efeito combinado do paradigma da tecnologia da informação e das formas e processos sociais, induzidos pelo processo atual de transformação histórica.” (Idem).

[...] o novo sistema de comunicação transforma radicalmente o espaço e o tempo, as dimensões fundamentais da vida humana. Localidades ficam despojadas de sentido cultural, histórico e geográfico e reintegram-se em redes funcionais ou em colagens de imagens, ocasionando um espaço de fluxos que substitui o espaço de lugares. O tempo é apagado do novo sistema de comunicação, já que passado, presente e futuro podem ser programados para interagir entre si na mesma mensagem. O espaço de fluxos e o tempo intemporal são as bases principais de uma nova cultura, que transcende e inclui a diversidade dos sistemas de representação historicamente transmitidos: a cultura da virtualidade real, onde o faz-de-conta vai se tornando realidade. (Idem, p.462, grifo do autor).

Diante do avanço tão significativo da tecnologia, que conseqüentemente acaba gerando mudanças na sociedade, existem duas formas de o sujeito se manifestar a respeito: ou ele é apocalíptico, ou é integrado. Essas denominações tornaram-se tradicionais com Umberto Eco. Assim, os apocalípticos são os pessimistas em relação às novas tecnologias, enquanto que os integrados são os otimistas. Porém, para Jorge (1998) , essas duas visões partem de premissas duvidosas e errôneas.
Os pessimistas condenam os efeitos danosos dos meios de comunicação de massa diante de seu público e uma de suas falas mais constantes diz respeito à imagem. Eles acreditam que “a imagem, em seus vários suportes (cinema, vídeo, computador) se transforma, deixando de ser reprodução do real para virar simulacro do real.” (JORGE, 1998, p.28). Para Jorge essa premissa é apenas parcialmente correta, pois “vai depender do caráter sígnico que essa imagem mantém com o objeto que ela representa” (Idem). O autor defende que “não há imagem universal que seja compreendida por todos do mesmo modo.” (Idem).
Sobre a impressão de que a imagem é mais importante e, atualmente, mais utilizada do que a palavra, Jorge pontua que as imagens precisam da sustentação verbal para que não ocorra a ambigüidade. Ele diz que ”o texto explica mais e melhor do que as imagens.” (Idem). E esse é o motivo de, na internet, haver mais textos do que ilustrações.
Já para os integrados, que defendem a idéia da “aldeia global”, Jorge argumenta dizendo que “também o texto está sujeito a diferentes interpretações.” (Idem, p.30). Assim, “todo enunciado pode ser considerado, inicialmente, em sua literalidade, mas não é obrigado a ser considerado apenas em seu sentido literal.” (Idem, grifo do autor). O mesmo acontece com os produtos culturais, “toda cultura produz estereótipos dos sujeitos pertencentes a outras culturas, e esses estereótipos também são reduções, simplificações ou ainda interpretações.” (Idem). Ou seja, na visão de Jorge, o conceito de aldeia global “é uma ficção e, dificilmente será uma realidade total.” (Idem).
Seja qual for a linha de raciocínio, é fundamental reconhecer as mudanças sociais ocorridas a partir do avanço das tecnologias de informação e comunicação, que caracterizam o atual momento histórico/econômico/cultural que a humanidade vivencia. Essas transformações são tão profundas e significativas que tornou-se consenso entre os diversos autores proclamar que o mundo está em uma nova era. A este início de uma nova ordem convencionou-se chamar de Sociedade da Informação.
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REFERÊNCIAS
LIMA, Frederico O. A sociedade digital: o impacto da tecnologia na sociedade, na cultura, na educação e nas organizações. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2000. 152 p.
LYON, David. Pós-modernidade. São Paulo: Paulus, 2005. 131p.
TAKAHASHI, Tadao. Sociedade da Informação. In: PERUZZO, Cecília, BRITTES, Juçara (Org). Sociedade da Informação e Novas Mídias: participação ou exclusão?. São Paulo: INTERCOM, 2002. 139 p.
LÉVY, Pierre. Cibercultura. 2.ed. São Paulo: Ed. 34 Ltda. 2000. 264p.
JORGE, Ricardo. Olhar midiático. Revista de Comunicação e Informação da UFC, n1, 1998.